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Lei de cotas ajuda a reduzir desigualdades, diz universidade americana

Os pesquisadores acompanharam a trajetória dos estudantes e mostraram que as cotas fazem diferença na formação daqueles que ingressam pelo sistema

Por Redação em 16/04/2022 às 19:44:56

Pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, mostram que a Lei de Cotas no Brasil é eficiente e ajuda a reduzir desigualdades socioeconômicas no paĂ­s. Utilizando dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais AnĂ­sio Teixeira (Inep) e do Ministério do Trabalho eles calculam que os ganhos, sejam na renda, sejam na qualidade da formação, para alunos cotistas é maior do que as perdas para os estudantes não cotistas que acabam não sendo aprovados em uma universidade federal.

Os pesquisadores acompanharam a trajetória dos estudantes e mostraram que as cotas fazem diferença na formação daqueles que ingressam pelo sistema. Para isso, eles analisaram a trajetória dos candidatos que foram aprovados em Ășltimo lugar nos cursos que selecionaram como primeira opção no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), tanto no sistema de cotas, quanto no de ampla concorrĂȘncia, e também daqueles candidatos que quase foram aprovados, ficaram logo depois dos Ășltimos colocados.

Comparando a formação de quem entrou com quem acabou ficando de fora, a conclusão é que, entre os cotistas, a diferença nos ganhos na renda foi, em média, trĂȘs vezes maior do que aquela observada entre os não cotistas. Os cotistas que ingressaram nas universidades tiveram um ganho de R$ 84 a mais do que aqueles que não entraram. Entre os não cotistas, essa diferença foi de R$ 27. JĂĄ em termos de qualidade de formação, entre os cotistas, os ganhos foram 1,6 vezes maiores do que entre os não cotistas. Esses valores aumentam em cursos mais concorridos como medicina ou engenharias, nos quais as vantagens para os cotistas são ainda maiores.

O estudo estĂĄ detalhado em artigo, escrito pelos pesquisadores chilenos Nano Barahona e SebastiĂĄn Otero e pelo brasileiro CauĂȘ Dobbin, todos Ph.D. em economia e estĂĄ disponĂ­vel, em inglĂȘs, online. "Podemos dizer que a polĂ­tica de cotas atingiu o objetivo para que foi criada: reduzir a desigualdade no acesso ao ensino superior. Os dados mostram claramente uma maior igualdade no acesso ao ensino superior em vĂĄrias dimensões, tais como renda, raça e tipo de escola - pĂșblica versus privada. A redução na desigualdade foi especialmente significativa em cursos tradicionalmente mais concorridos, como medicina", diz.

No estudo, os pesquisadores usaram dados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), para avaliar o ingresso, entre 2010 e 2016; os dados do Censo da Educação Superior, de 2009 a 2019, para avaliar a trajetória dos alunos; e os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) para medir a renda das carreiras escolhidas pelos jovens.

A pesquisa mostra que a Lei de Cotas representa uma grande oportunidade para os estudantes, que sem ela, não ingressariam em uma universidade pĂșblica e que isso gera ganhos. Em relação aos não cotistas, apesar de terem ficado de fora, no geral, não houve perda na qualidade da educação recebida.

"Nossa conclusão é que os não cotistas que não conseguiram uma vaga em uma faculdade federal por resultado da polĂ­tica de cotas muitas vezes se matriculam em faculdades privadas que tĂȘm a mesma qualidade. Isso acontece porque os não cotistas tĂȘm renda mais alta, em média, e conseguem arcar com a mensalidade de uma boa faculdade privada. Então a perda para os alunos não-cotistas, em termos da qualidade da educação recebida, é menor do que os ganhos para os cotistas", diz Dobbin.

Inclusão

No Brasil, a Lei de Cotas (Lei 12.711/12) estabelece que 50% de todas as vagas das universidades federais e das instituições federais de ensino técnico de nĂ­vel médio sejam reservadas a estudantes de escolas pĂșblicas. Metade delas deve ser ocupada por estudantes de famĂ­lias de baixa renda, de até 1,5 salĂĄrio mĂ­nimo por pessoa, o equivalente a R$ 1.818 por mĂȘs.

A lei prevĂȘ também a reserva de vagas para estudantes pretos, pardos, indĂ­genas e com deficiĂȘncia de acordo com a porcentagem dessas populações em cada unidade federativa. A principal porta de entrada nas universidades federais é o Sisu, no qual o estudante pode concorrer a vagas em até duas opções de curso. A opção pelas cotas é feita na hora da inscrição. O sistema usa como forma de seleção as notas do Enem.

Segundo a pesquisa, ações afirmativas como a Lei de Cotas não são exclusividade brasileira. Cerca de um quarto dos paĂ­ses do mundo usam alguma ação afirmativa no ensino superior para promover a inclusão de determinados grupos de estudantes. Os pesquisadores ponderam que essas ações são necessĂĄrias porque as notas dos estudantes estão relacionadas fortemente ao status socioeconômico, ou seja, estudantes de famĂ­lias mais ricas tendem a tirar melhores notas. Sem polĂ­ticas afirmativas, as universidades se tornam ambientes excludentes.

A polĂ­tica de cotas, de acordo com o estudo, permitiu que o nĂșmero de estudantes de escolas pĂșblicas, no geral, aumentasse 47% nas universidades federais e o nĂșmero de estudantes negros de escolas pĂșblicas aumentasse 73%.

Para a reitora da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Joana Angélica Guimarães da Luz, que é membro da Comissão de Desenvolvimento AcadĂȘmico da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), a inclusão é o maior ganho da polĂ­tica de cotas.

"A universidade sempre foi voltada para a classe média, para pessoas que tĂȘm poder aquisitivo e nĂ­vel social. O fato de trazer pessoas que sempre estiveram de fora desse processo amplia e melhora as relações existentes nos vĂĄrios extratos sociais do nosso paĂ­s", diz e acrescenta: "Aqui no Brasil a gente vive em espécie de redomas, temos condomĂ­nios de um lado e, do outro lado da rua, temos pobreza. Temos periferias absolutamente abandonadas. O acesso à educação, o acesso dessas pessoas ajuda a sociedade a pensar sobre si mesma".

Revisão

Este ano é um ano decisivo para a Lei de Cotas. A própria legislação prevĂȘ que o texto seja revisado dez anos após a publicação, ou seja, em 2022. Por conta disso, uma série de propostas tramitam no Congresso Nacional. Os projetos propõem desde a transformação da Lei de Cotas em polĂ­tica permanente no paĂ­s (PL 1.676/2021) à ampliação do prazo para a revisão nacional (PL 3.422/2021) e até mesmo a exclusão do critério étnico-racial para o acesso ao ensino superior (PL 1.531/19).

Segundo Joana, a lei precisa ser mantida, assim como as reservas de vagas étnico-raciais. Além disso, a reitora defende que a avaliação da polĂ­tica não seja restrita apenas ao desempenho dos estudantes, mas também considere o impacto social do ingresso de determinados grupos nas universidades.

A reitora ressalta que a polĂ­tica de cotas faz com que os estudantes de escolas pĂșblicas vejam as universidades federais não como algo muito distante da realidade, mas como uma possibilidade e que isso ajuda inclusive na melhora da educação nessas escolas. "A melhoria da escola pĂșblica é um processo. É preciso empoderar algumas pessoas dessas comunidades para que digam: a gente pode, tem direito e quer uma escola melhor", diz.

Fonte: AgĂȘncia Brasil

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