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Advogados pedem explicação sobre aplicativo instalado sem permissão

ParanĂĄ teve no ano passado problema semelhante ao de São Paulo

Por Elaine Patricia Cruz - Repórter da Agência Brasil - São Paulo em 14/08/2023 às 19:24:48
© Tânia Rêgo/Agência Brasil

© Tânia Rêgo/Agência Brasil

Professores, alunos e pais de alunos da rede estadual de ensino de São Paulo foram surpreendidos, na semana passada, com a instalação de um aplicativo, chamado de Minha Escola SP, em seus aparelhos celulares particulares sem autorização. Problema semelhante ocorreu no ano passado no ParanĂĄ que, na época, tinha à frente da Secretaria Estadual da Educação o atual titular da pasta em São Paulo, Renato Feder.

O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) informou que foi procurado por um grande nĂșmero de professores que relatavam a instalação do aplicativo em seus celulares, "sem que tenham autorizado, como exige a Lei Geral de Proteção de Dados", e que procurou a Secretaria Estadual da Educação para esclarecer o caso, tendo sido informado de que "a empresa contratada instalou indevidamente o aplicativo por meio do chip corporativo enviado pelo governo aos servidores".

A Secretaria da Educação (Seduc) disse que instaurou "processo administrativo para apurar todas as circunstâncias relativas à instalação involuntĂĄria do aplicativo Minha Escola". Segundo a pasta, "a falha ocorreu durante um teste promovido pela ĂĄrea técnica em dispositivos especĂ­ficos da Seduc".

"Assim que identificou o equĂ­voco que levou à instalação do app em dispositivos conectados às contas Google institucionais, a reversão foi acionada com o envio de solicitações para exclusão do aplicativo. O usuĂĄrio também pode excluir o app por conta própria, se preferir. A Seduc lamenta o ocorrido e reforça que as medidas cabĂ­veis estão sendo adotadas", diz nota divulgada pela secretaria.

Para especialistas ouvidos pela AgĂȘncia Brasil e pela TV Brasil, a Seduc precisa informar realmente como isso tudo ocorreu, que dados foram vazados e se algum tipo de informação privada pode ter sido acessada.

Em princĂ­pio, é possĂ­vel dizer que houve uma infração da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), afirmou Carlos Coninck, especialista no assunto. "Quando falamos em instalação de aplicativos, é necessĂĄrio ter um prévio consentimento do titular de dados", disse Coninck, lembrando que isso estĂĄ previsto na LGPD, que estĂĄ em vigor desde 2020. "A infração existe porque houve um acesso não autorizado para a instalação de um aplicativo que não teve prévio consentimento."

No entanto, destacou Coninck, ainda não é possĂ­vel dizer se houve invasão de privacidade. É preciso entender melhor como foi realizada a operação e como o Estado conseguiu instalar esse aplicativo, se foi por meio de chip, se foi por meio do Google Institucional, se foi por meio de atualização do software." A violação de privacidade ocorreria se o aplicativo Minha Escola SP tiver dado acesso a outros aplicativos ou a pastas pessoais do usuĂĄrio, tais como fotos e arquivos.

"Diante de um incidente como esse, que envolve dados pessoais, é importante a secretaria conduzir uma anĂĄlise forense, uma auditoria, em que possa precisar para toda a sociedade, especialmente os professores e alunos, como se deu essa instalação, qual o perĂ­odo relacionado a ela, qual foi a metodologia empregada, se houve necessariamente o compartilhamento de dados pessoais, quantos dispositivos foram envolvidos na atualização e, principalmente, quais dados pessoais foram transacionados", disse o advogado e especialista em crimes cibernéticos José Antonio Milagre, que também é presidente da Comissão de Direito Digital da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Barueri, em São Paulo.

De acordo com Milagre, ainda não é possĂ­vel afirmar como foi possĂ­vel instalar o aplicativo nos celulares, inclusive particulares, sem autorização. O especialista citou algumas possibilidades: atualização do sistema operacional dos dispositivos, contas institucionais vinculadas aos celulares e até compartilhamento de informações entre a secretaria e o Google. "O que deve ser feito é uma investigação. E, mesmo a secretaria sendo um órgão pĂșblico, estĂĄ sujeita à LGPD", ressaltou o advogado.

Na Ășltima sexta-feira (11), as deputadas federais Erika Hilton e Luciene Cavalcante, do PSOL, protocolaram representação no Ministério PĂșblico para que o caso seja investigado. "Como a secretaria teve acesso a esses dispositivos sem autorização? O que aconteceu com os dados dessas pessoas? Para quem foram repassadas essas informações? São perguntas para as quais exigimos resposta", escreveu a deputada Erika Hilton em suas redes sociais.

Proteção de dados

Os especialistas ouvidos pela EBC destacam que os professores e alunos que se sentirem violados podem acionar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). "O titular que sentir que teve infração à Lei Geral de Proteção de Dados, à sua privacidade e ao tratamento de dados pode, e deve, buscar a ANPD, que é responsĂĄvel pela aplicação e fiscalização da lei em território nacional. É ela quem vai instaurar um inquérito administrativo para verificar aquela irregularidade e aplicar a sanção que é cabĂ­vel", disse Coninck.

As pessoas também podem buscar uma resposta judicial. "Tendo algum prejuĂ­zo efetivo, a pessoa pode vir a buscar isso na esfera judicial, mas o que se determina, desde jĂĄ, é que se instaure um processo na ANPD para que sejam investigadas quais foram as causas, como isso se deu, quais dados foram acessados, quais dados tiveram tratamento e como foi feita essa instalação", ressaltou.

"A lei não exclui um eventual processo judicial. [Para] aquelas pessoas que comprovarem danos a partir desses vazamentos de dados, a lei não exclui a possibilidade de uma busca judicial", confirmou Milagre.

Entre as sanções possĂ­veis que a Seduc pode enfrentar estão, por exemplo, advertĂȘncia, publicização da infração, bloqueio dos dados pessoais referentes à infração, eliminação dos dados pessoais referentes à infração e suspensão ou proibição do exercĂ­cio de tratamento dos dados pessoais, entre outros.

"Se for comprovado que, para essa instalação, houve compartilhamento ou tratamento irregular dos dados desses professores e pais de alunos, isso pode caracterizar uma violação da LGPD. Embora seja um órgão pĂșblico e não esteja sujeito a uma ação pecuniĂĄrio, nada impede que a secretaria sofra outras sanções previstas na Lei de Proteção de Dados", disse Milagre.

Google

"A partir do momento em que as pessoas tiveram os aplicativos instalados, elas merecem informações. Elas merecem informações da secretaria e merecem explicações do Google. Hoje, pela LGPD, essas pessoas tĂȘm o direito de tensionar, de questionar. Elas podem, por meio dos encarregados de proteção de dados, fazer um questionamento sobre como isso ocorreu, o que foi armazenado, como isso se deu, que medidas pode fazer para preservar sua segurança e o que mais ela deve saber sobre seus dados. Essas empresas ou agentes de tratamento tem dever de responder a esse titular dos dados", acrescentou Milagre.

Em nota, a empresa Google informou que o Google Workspace for Education é uma plataforma utilizada por diversas instituições de ensino no Brasil e no mundo" e que "os termos de serviço da plataforma estão de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados".

Segundo a empresa, os gestores das instituições de ensino são os responsĂĄveis pela administração, configuração e gestão dos dados dos usuĂĄrios e dos aparelhos cadastrados. "O Google não opera e não exerce qualquer ingerĂȘncia nos comandos escolhidos e implementados pelos parceiros", informou.

"Além disso, como também previsto na LGPD, a plataforma oferece uma central de transparĂȘncia para que os usuĂĄrios possam monitorar o uso, verificar as configurações de segurança e fazer escolhas relevantes para a proteção de seus dados. É importante ressaltar que não participamos do desenvolvimento, dos testes e nem da instalação do aplicativo citado pela reportagem", disse a empresa, por meio de nota.

Edição: NĂĄdia Franco

Fonte: AgĂȘncia Brasil

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