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CPI: mĂ©dico confirma denĂșncias contra Prevent Senior

Walter Souza Neto diz que autonomia nas prescrições não era respeitada

Por Redação em 07/10/2021 às 19:57:46

Em um depoimento cheio de denĂșncias contra condutas da Prevent Senior, o ex-médico da operadora de SaĂșde Walter Souza Neto confirmou, nesta quinta-feira (7), à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia do Senado, que a operadora determinou a entrega do chamado "kit covid", conjunto de medicamentos sem eficĂĄcia comprovada para tratamento da covid-19.

Segundo o médico, quem se recusasse a prescrever os medicamentos sofria represĂĄlias. "Com a pandemia, eu acabei me recusando a prescrever o kit covid e fui repreendido por isso." Ele acrescentou que a Prevent Senior começou a prescrever o kit em março de 2020 e que outros profissionais que tiveram a mesma conduta dele também foram advertidos pela empresa.

"De fato, era obrigatório. Não havia autonomia médica. Nem em instituição havia uma hierarquia tão rĂ­gida como na Prevent. No ambiente, todos tinham medo de contrariar os superiores", disse.

Segundo o médico, no inĂ­cio da pandemia a pressão pela prescrição dos medicamentos não era explĂ­cita. "Era algo velado. Falavam para prescrevemos, para manter nosso emprego". O médico afirmou que chegou a receitar os medicamentos, mas advertia os pacientes. "Eu fazia isso na Prevent, e avisava aos pacientes que aquilo era um protocolo institucional. E que não tinha evidĂȘncia cientĂ­fica. Depois de um tempo com mais evidĂȘncias falĂĄvamos inclusive para não utilizarem todos os medicamentos do kit, só as vitaminas", relatou.

O médico relatou que a falta de autonomia dos profissionais era tanta que, em certa ocasião, no inĂ­cio da pandemia, chegou a ser obrigado a retirar a mĂĄscara para não assustar os pacientes. Segundo o médico, a ordem partiu da médica conhecida como DrÂȘ. Paola, a mesma que havia dito "prescreve cloroquina pra quem espirrar. Espirrou, dĂĄ cloroquina nele". A troca de mensagem entre o médico e a gestora foi apresentada à CPI pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) na reunião de ontem.

Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPIPANDEMIA) realiza oitiva de beneficiĂĄrio e de ex-médico da Prevent Senior. A operadora de saĂșde é acusada de ocultar mortes de pacientes por Covid-19 e de pressionar médicos a prescreverem
A operadora de saĂșde é acusada de ocultar mortes de pacientes por covid-19 e de pressionar médicos a prescreverem - Edilson Rodrigues/AgĂȘncia Senado

Wong

O ex-médico também lembrou o caso do pediatra, toxicologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Anthony Wong, que morreu por complicações da covid-19 em janeiro deste ano. "Essa questão do prontuĂĄrio [de Anthony Wong] é um caso interessante. Não tem dĂșvida. Dez entre dez médicos que avaliarem aquele prontuĂĄrio [vão atestar]: "morreu de covid", não tem outro jeito. Isso estĂĄ muito claro", destacou o depoente.

Walter Souza Neto admitiu que não atendeu Wong, mas teve acesso ao prontuĂĄrio. "A declaração de óbito de Anthony Wong foi fraudada. Não tem a covid lĂĄ. Ele morreu de covid fazendo o tratamento precoce duas vezes e seria muito feio isso ficar claro, aĂ­ tentaram sustentar essa tese", disse. Essas supostas fraudes em documentos aconteciam para "sustentar a desinformação" sobre a covid-19.

No dia em que prestou depoimento à CPI, o diretor da Prevent Senior Pedro Batista JĂșnior não comentou casos de óbitos de pacientes em hospitais da rede, sob o argumento de que não tinha autorização das famĂ­lias.

Questionado pelo relator da CPI, o senador Renan Calheiros (MDB-AL), se as declarações do presidente da RepĂșblica, Jair Bolsonaro, sobre o "kit covid" podem ter influenciado pacientes, Souza Neto disse que sim. "Pode induzir as pessoas ao erro. É uma desinformação que pode fazer com que as pessoas deixem de tomar outras medidas", avaliou o médico.

Redução de Custos

Ao falar sobre as condutas da Prevent Senior, Souza Neto destacou que, mesmo antes da pandemia, a empresa buscava a redução de custos no tratamento. O profissional disse que além de cercear a autonomia médica, a operadora restringia a realização de exames. "Era um modelo basicamente voltado para os custos, e não para o bem-estar que o paciente precisava. Algumas situações não são exclusivas da pandemia. São coisas que acontecem na Prevent de forma crônica e estão inseridas na cultura da empresa. Existe um pequeno nĂșmero de médicos, muitas vezes envolvidos com a direção, que acaba até induzindo outros médicos ao erro", disse.

Segundo o especialista, às vezes, o médico tinha que negociar com quem era seu superior para fazer determinada coisa e aquilo não era autorizado. "Às vezes, o paciente evoluĂ­a com gravidade ao óbito. Isso era uma polĂ­tica antiga da empresa", denunciou Walter Correa.

Sobre o ambiente de trabalho na Prevent Senior, o médico classificou como hostil, com clima de "lealdade e obediĂȘncia". O termo, que jĂĄ foi lema da empresa e não era mais utilizado, mas a cultura permaneceu. "Fui bombeiro militar e policial civil e não havia hierarquia tão rĂ­gida como o que acontecia na Prevent Senior. Era muitas vezes uma hierarquia baseada em assédio moral. VocĂȘ se voltar contra qualquer orientação do seu superior, significaria em represĂĄlias importantes, talvez perder seu trabalho", destacou o depoente.

Fraude

Aos senadores, Souza Neto disse que os médicos da Prevent Senior sabiam que o tratamento de pacientes da covid-19 com hidroxicloroquina não trazia os resultados prometidos e divulgados pela direção da operadora. Ele classificou como "fraude" o estudo desenvolvido pela empresa para justificar a prescrição da droga.

"Essa coisa de que ninguém vai a óbito e ninguém intuba, isso jĂĄ era muito claro: a gente sabia que era fraude. Além de o estudo ser muito ruim, jĂĄ quando foi publicado, em abril, eu internava paciente que havia tomado o kit. Eu acompanhava esse paciente depois pelo prontuĂĄrio durante a internação e via esses pacientes irem a óbito", afirmou.

Outro lado

Em nota enviada à AgĂȘncia Brasil, a Prevent Senior negou as prĂĄticas denunciadas por Souza Neto que classificou como " infundadas" e disse que o depoimento não trouxe fatos, "apenas narrativas que faltam com a verdade".

"A denĂșncia mais grave é sugerir que os médicos da empresa optem pela adoção de cuidados paliativos para matar pacientes e economizar recursos, o que tanto os médicos quanto a direção da empresa veementemente contestam", diz a nota.

A operadora destaca que estĂĄ colaborando para que órgãos técnicos, como o Ministério PĂșblico e PolĂ­cia Civil, investiguem todas estas acusações para restabelecer a verdade dos fatos.

Edição: Bruna Saniele.

Fonte: AgĂȘncia Brasil

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