PREFEITURA SANTANA

Após ataque, especialistas propõem escuta ativa nas escolas

Ações de acolhimento pós-traumĂĄtico devem envolver toda a comunidade

Por Camila Boehm - Repórter da Agência Brasil - São Paulo em 10/04/2023 às 19:17:22
© Fernando Frazão/Agência Brasil

© Fernando Frazão/Agência Brasil

Ações de acolhimento após eventos traumĂĄticos devem envolver toda a comunidade escolar, incluindo estudantes, pais, responsĂĄveis e funcionĂĄrios, além de escuta ativa e capacitação dos profissionais da educação. E o perĂ­odo das ações deve ser prolongado, afirmam especialistas ouvidos pela AgĂȘncia Brasil.

Após duas semanas do ataque à Escola Estadual Thomazia Montoro, na zona oeste da capital paulista, os estudantes voltaram às aulas nesta segunda-feira (10), com um plano de acolhimento que inclui também pais e responsĂĄveis e equipe escolar.

"Para combater a violĂȘncia extremista nas escolas, é necessĂĄrio fortalecer os grĂȘmios estudantis, as associações de pais, responsĂĄveis e os conselhos escolares como meios de mobilização. Além disso, é importante aprimorar as disciplinas de humanidades, incluindo abordagens antirracistas, feministas e emancipadoras", diz a coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda.

Para ela, outra medida relevante é oferecer formação continuada aos profissionais da educação e capacitĂĄ-los a identificar sinais de aproximação de grupos extremistas e a combater mĂșltiplas formas de violĂȘncia.

Segundo a educadora, as intervenções para lidar com o luto, o trauma e promover a resiliĂȘncia precisam ser adequadas ao estĂĄgio de desenvolvimento do grupo afetado.

"As intervenções devem fornecer segurança psicológica e fĂ­sica e envolver os pais e a comunidade, transmitindo esperança. É essencial oferecer orientações sobre onde as vĂ­timas podem buscar suporte de longo prazo. Todos os profissionais que prestam assistĂȘncia precisam saber como lidar com crises, desastres e traumas."

De acordo com a pedagoga e mestre em psicologia educacional pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Sandra Dedeschi, em casos como esse, as escolas precisam ter clareza da importância de espaços de escuta ativa. "Não podem ser ações isoladas. Precisarão estar presentes por bastante tempo na escola. É claro que talvez de forma mais acentuada nas primeiras duas ou trĂȘs semanas, mas não se lida com o luto, com um trauma tão grande, em dois, trĂȘs momentos de diĂĄlogo."

Para Sandra, é preciso que as escolas deixem um canal aberto caso os estudantes sintam necessidade de conversar sobre o problema – pode ser um gestor, um professor de confiança ou alguém com quem os alunos se identifiquem. Os espaços de escuta devem permitir que falem do que eles estão sentindo e das dĂșvidas que possam ter.

"O que precisa ter nesses espaços de conversa? Ajudar os estudantes a identificar o que eles estão sentindo. Às vezes, posso estar chamando de medo a raiva. Como é que se pode identificar o que se estĂĄ sentindo, se tivesse que dar um nome para isso? Explicar quais as sensações no corpo, que pensamentos aparecem. Outros vão dizer: "é isso mesmo, eu também sinto isso". Esses espaços [são] para que eles possam ir falando e identificando o que estão sentindo."

Do ponto de vista psicossocial, Andressa Pellanda ressalta que outras ações podem ser tomadas como medidas preventivas, como criar grupos terapĂȘuticos e espaços de acolhimento dentro das escolas; orientar os profissionais da educação e a comunidade em geral sobre como identificar e agir em caso de ameaças iminentes; garantir a presença permanente de psicólogos e orientadores educacionais nas escolas; estabelecer mecanismos de prevenção e discutir questões de violĂȘncia envolvendo misoginia, racismo, LGBTQIA+fobia, islamofobia e antissemitismo.

Retorno

O reinĂ­cio das atividades na Escola Estadual Thomazia Montoro incluiu, no primeiro dia, trĂȘs turmas, com cerca de 90 alunos, e os responsĂĄveis acompanhantes, que tiveram apoio de equipes multiprofissionais de saĂșde. A partir de terça-feira (11), todos os estudantes voltam às aulas e, durante toda a semana, participarão de rodas de conversa, oficinas de consciĂȘncia corporal e jogos colaborativos.

A escola passa também a contar com reforço da Ronda Escolar e apoio constante do Gabinete Integrado de Segurança e do Programa Escola Mais Segura, ações que resultam da iniciativa integrada das secretarias estaduais da Educação, de SaĂșde, de Justiça e Cidadania e Segurança PĂșblica, com apoio do municĂ­pio e da organização não governamental (ONG) Instituto Superação.

É preciso destacar que a implementação de medidas de segurança, como instalação de catracas e detectores de metal, além da presença de seguranças armados nas escolas não é uma solução efetiva para combater o extremismo de direita. "Tais medidas podem até mesmo aumentar as ameaças, tornando o clima escolar insalubre e promovendo a propaganda extremista dentro da própria escola", destaca Andressa Pellanda.

Segundo a educadora, é essencial garantir um ambiente escolar saudĂĄvel e acolhedor, que incentive a criatividade, a crĂ­tica e a construção de conhecimento.

O governo do estado informou que, após o ataque à escola, a PolĂ­cia Militar reuniu os comandantes das companhias de ĂĄrea com os diretores de colégios para discutir a ampliação dos programas e estratégias de combate a agressores ativos. Além desta medida, a gestão estadual estuda contratar policiais da reserva para que fiquem de forma permanente nas escolas.

Ataque

Na manhã de 27 de março, uma segunda-feira, a Escola Estadual Thomazia Montoro foi alvo de um ataque provocado por um adolescente de 13 anos. A professora Elizabeth Tenreiro, de 71 anos, morreu após ser esfaqueada pelo aluno. Segundo o governo paulista, Elizabeth Tenreiro era funcionĂĄria aposentada do Instituto Adolfo Lutz e, desde 2013, trabalhava como professora.

Estudo da Unicamp revela que, desde 2002, houve 23 ataques a escolas no paĂ­s.

Edição: NĂĄdia Franco

Fonte: AgĂȘncia Brasil

Comunicar erro

ComentĂĄrios

DETRAN AL