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PNI busca padronizar plataformas de dados de vacinação

Objetivo Ă© simplificar comunicação entre sistemas

Por Vinícius Lisboa - Repórter da Agência Brasil - Rio de Janeiro em 25/09/2023 às 19:11:43
© Tomaz Silva/Agência Brasil

© Tomaz Silva/Agência Brasil

Depois de aplicar a injeção e acalmar o choro de mais uma criança imunizada, os profissionais da sala de vacina tĂȘm outra tarefa importante a cumprir: preencher os dados daquela vacinação nos sistemas de informação do Programa Nacional de Imunizações (PNI). Se hoje o paĂ­s estĂĄ em alerta com a baixa nas coberturas vacinais e age para revertĂȘ-la, é a partir do retrato extraĂ­do desses dados que qualquer medida pode ser planejada e executada. Essa fotografia, porém, estĂĄ embaçada por um quadro crônico de deficiĂȘncias que prejudicam as polĂ­ticas de imunização e dificultam a reação do PNI à hesitação vacinal.

O diretor do Programa Nacional de Imunizações, Eder Gatti, conta que um objetivo prioritĂĄrio do ministério é a padronização de todas as plataformas que registram a vacinação no paĂ­s, de modo que todas alimentem de forma direta a Rede Nacional de Dados em SaĂșde (RNDS). Esse movimento vai simplificar a comunicação entre os sistemas e também permitirĂĄ apresentar as informações à população via ConectSUS. O aplicativo foi fundamental na pandemia de covid-19 para a apresentação dos certificados de vacinação.

"Funcionou muito bem para a covid e agora nós estamos expandindo para a rotina. Então, temos uma série de ações no sentido de organizar os sistemas de informação para dar maior qualidade e melhor controle das ações do programa de imunização e uma maior vigilância das coberturas vacinais."

As dificuldades com os sistemas de informação produzem obstĂĄculos que vão além de uma percepção menos precisa das coberturas vacinais. A própria gestão das doses disponĂ­veis para aplicação, por exemplo, acaba prejudicada quando as informações das salas de vacina não alimentam diretamente a RNDS. A estrutura atual impede que haja um diagnóstico correto das doses perdidas quando um frasco é aberto e nem todas as doses são aplicadas.

"A gente precisa de sistemas de informação que nos indiquem onde estĂĄ o desperdĂ­cio. Enquanto os dados da rotina não estiverem indo para a RNDS, sendo possĂ­vel integrar com o sistema de logĂ­stica, estoque e movimentação, a gente não vai conseguir monitorar isso. O SUS perde dinheiro com essa história de perder quatro meses para o dado subir. TrĂȘs, dois, um mĂȘs que seja. Resolver o sistema de informação é uma prioridade", destaca Gatti.

 A técnica de enfermagem ThaĂ­s Marques seleciona vacinas na câmara de resfriamento do Centro Especial de Vacinação Álvaro Aguiar.
Sistemas de informação bem organizados ajudam a identificar onde hĂĄ desperdĂ­cio de vacinas - Fernando Frazão/AgĂȘncia Brasil

Antes da digitação

A informatização do PNI começou a ser implementada em 1990 e levou toda a década até que o Sistema de Informações do PNI (SI-PNI) chegasse a todos os estados e municĂ­pios do paĂ­s. Nas décadas anteriores, as planilhas de papel com os dados eram consolidadas pelos estados e enviadas ao governo federal, que não tinha as coberturas vacinais por municĂ­pio nem sabia quem eram as pessoas vacinadas.

Representante da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) no Rio Grande do Norte, a enfermeira Antônia Teixeira trabalhou como consultora técnica na ĂĄrea de sistemas de informação do PNI entre 2005 e janeiro de 2023. Ela conta que a informatização foi importante para fortalecer o planejamento da vacinação de rotina. O modelo inicial, porém, ainda trazia dificuldades importantes por ainda não permitir um registro nominal de vacinados.

"VocĂȘ não sabia quem tinha sido vacinado, só sabia quantas doses tinham sido feitas. E isso jĂĄ traz um viés, porque se subentende que uma dose representa uma pessoa. Se o esquema vacinal de uma determinada vacina é de uma dose, para cada dose, vocĂȘ imaginava um indivĂ­duo vacinado", conta a enfermeira, que ressalta que havia distorções causadas por essa forma de registro. "Nos grandes centros, as coberturas tendiam a ser melhores. Na BCG, por exemplo, como é uma vacina recomendada para ser feita ainda na maternidade, o que acontecia com os municĂ­pios que não tinham maternidade? A vacinação era muito baixa, porque as crianças eram vacinadas em outros municĂ­pios."

Era comum também que doses aplicadas em duplicidade inchassem as coberturas vacinais. Se uma pessoa perdia a caderneta de vacinação do filho e retornava ao posto para conseguir uma nova, havia o risco de algumas vacinas serem repetidas e contarem duas vezes na cobertura vacinal daquela cidade. Esses problemas levaram à discussão de que era preciso um sistema nominal, capaz de saber quem recebia as doses e, ao mesmo tempo, de preservar o direito à privacidade dos usuĂĄrios do Sistema Único de SaĂșde. Nos anos 2000, Antônia participou da criação e implantação desse sistema, que ficou pronto em 2009.

"Dessa forma, se o indivĂ­duo morar no PiauĂ­ e for vacinado em São Paulo, e o registro for feito corretamente, eu vou saber a residĂȘncia do indivĂ­duo, e a cobertura vacinal vai ser carregada para a residĂȘncia do indivĂ­duo."

Diferentes sistemas

O Ministério da SaĂșde, porém, não foi o Ășnico que se movimentou nesse sentido, e estados e até mesmo alguns municĂ­pios chegaram a criar sistemas próprios para ter dados nominais dos vacinados, o que criou uma complexa comunicação de diferentes sistemas de informação com os mesmos dados. A dificuldade aumentou com a criação e implantação do e-SUS, na década de 2010, antes mesmo que o sistema nominal anterior fosse totalmente assimilado pelas unidades de saĂșde. O profissional da sala de vacina, sujeito à alta rotatividade e à abrangĂȘncia cada vez maior do calendĂĄrio vacinal, também precisava manejar esses sistemas, para que os dados continuassem confiĂĄveis.

 Câmara de resfriamento onde são armazenadas vacinas no Centro Especial de Vacinação Álvaro Aguiar.
Profissionais de saĂșde devem preencher dados sobre vacinação nos sistemas de informação do Programa Nacional de Imunizações - Fernando Frazão/AgĂȘncia Brasil

"Nós podemos ter um bom sistema de informação, mas, se não tivermos um bom usuĂĄrio, não vamos ter informação de qualidade", resume. "Se vocĂȘ tem poucos profissionais de saĂșde na unidade, mesmo que esse profissional seja capacitado, registrar não é a coisa mais importante a se fazer em uma unidade de saĂșde, em que tem uma mesma pessoa que é registrador, vacinador, atendente. Essa informação pode ser comprometida."

O momento de maior conflito entre os sistemas de informação foi também quando as coberturas vacinais do Brasil começaram a cair, após 2015. Antônia Teixeira acredita que as dificuldades relacionadas ao preenchimento e envio dos dados podem estar entre causas, mas não explicam nem amenizam a gravidade dos nĂșmeros que apontam a redução da imunização. "Uma coisa é certa: hĂĄ problemas, sim, na integração das bases de dados. Nem todos os dados chegam ao sistema de informação como se esperava que chegassem."

Mesmo com as dificuldades, os sistemas de informação também oferecem ferramentas importantes para enfrentar a queda nas coberturas vacinais. Com o registro nominal dos vacinados, o governo federal e os estados conseguem identificar onde a busca ativa de pessoas que não se vacinaram é mais necessĂĄria, direcionar recursos e acionar a atenção bĂĄsica local para ir até a população. A busca ativa estĂĄ entre as principais ações que o Ministério da SaĂșde tem orientado durante as campanhas de multivacinação em cada estado e ações de microplanejamento nos municĂ­pios.

Rio de Janeiro (RJ), 21/08/2023 – A agente comunitĂĄria de saĂșde, Maria LĂșcia de AraĂșjo e o técnico em enfermagem, João Victor Pinho durante de busca ativa de pacientes com vacinação em atraso em IrajĂĄ, na zona norte da capital fluminense. Foto: Tomaz Silva/AgĂȘncia Brasil
Secretaria de SaĂșde do Rio de Janeiro faz busca ativa de pacientes com vacinação em atraso - Tomaz Silva/AgĂȘncia Brasil

ConectSUS

A consultora da Organização Pan-Americana de SaĂșde (Opas) Carla Domingues adiciona aos desafios desse cenĂĄrio problemas de instabilidade nos softwares usados para o registro dos dados de vacinação. A enfermeira foi coordenadora do PNI por 13 anos, no perĂ­odo em que foi feita a transição dos dados agregados com apenas as doses aplicadas para os dados nominais, com a identificação de quem foi vacinado.

"A primeira questão é ter um software com confiabilidade. Muitas vezes, o sistema era instĂĄvel, e, ao digitar os dados, eles não eram transmitidos para o nĂ­vel federal, ou se perdiam durante essa transmissão. E tĂ­nhamos dados divergentes entre estados e o nĂ­vel nacional", descreve. "A evolução dos softwares é fundamental para que a gente possa ter a garantia de que os dados que são colocados no municĂ­pio sejam os mesmos da base nacional. Mas o grande problema hoje é a falta de recursos humanos para fazer essa digitação, ou ter um recurso humano qualificado para fazer a digitação correta."

Edição: Juliana Andrade

Fonte: AgĂȘncia Brasil

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